GLAUCO DINIZ DUARTE – Carros diesel superam restrições ambientais
Carros diesel superam restrições ambientais. Com a legislação de emissões de poluentes mais rigorosa, muitos especialistas apostaram no encarecimento e, por consequência, na redução das vendas de veículos leves a diesel na Europa, onde o combustível move cerca de metade da frota – na França essa penetração passa de 70%. Os limites de emissões previstos pela norma Euro 6, cuja primeira fase entra em vigor na União Europeia a partir de 2014, imporia a adoção de tecnologias muito caras, reduzindo naturalmente o interesse dos europeus pelo diesel. Mas não parece ser essa a tendência. “Muitos dizem que pode ser o fim do diesel (para automóveis de passageiros), mas estou certo que não”, garante Xavier Cousin, diretor do Centro Técnico de Sistemas de Gerenciamento de Motores Diesel da Delphi em Blois, na França. “Existem possibilidades de evolução. Tudo é uma releitura da tecnologia”, afirma.
A Europa encontrou no diesel sua melhor solução para reduzir a emissão de gases de efeito estufa, o CO2. Tecnologias adotadas a partir da década de 90, como o sistema de injeção commom rail, tornaram os carros diesel de 25% a 30% mais econômicos do que os a gasolina, consequentemente emitindo cerca de 25% menos CO2. Contudo, é mais difícil (e caro) controlar os poluentes venenosos dos motores diesel (como CO, NOx e particulados), o que levou ao desafio de estimular o uso do combustível e, ao mesmo tempo, limitar severamente seus índices de poluição, por meio de tecnologias caras.
ALTA PRECISÃO
Sistema diesel Delphi Common Rail para veículos leves: redução de consumo e emissões.
“A legislação de emissões é o que move o nosso desenvolvimento de diesel aqui”, destaca Cousin. “Isso requer mais inovação, sistemas de alta pressão e melhorias nos motores.” O engenheiro explica que a evolução dos limites de emissões de poluentes na Europa aumenta sensivelmente a sofisticação dos projetos. Ele cita o exemplo da elevação exponencial, nos últimos anos, da pressão de injeção de diesel na câmara de combustão do motor, para tornar “mais limpa” a queima do combustível: na norma Euro 3, variava de 1,4 mil a 1,6 mil bar, passou a até 1,8 mil bar com a Euro 4, subiu a 2 mil bar com a atual Euro 5 e chegará a 2,2 mil bar na Euro 6, a partir de 2014.
Com isso, os sistemas de injeção, incluindo bombas, injetores e gerenciamento eletrônico, precisaram ser tão precisos quanto robustos, o que muitas vezes encarece os custos de produção. Cousin explica que atualmente um motor diesel é um instrumento de alta precisão, com temperaturas na câmara de combustão que variam de 250 a 350 graus centígrados, cada cilindro recebe o spray de combustível a 1,5 mil milhas por hora (velocidade equivalente a de um jato supersônico) e cada bico injetor trabalha com ciclos de abertura de 0,5 milissegundo (a frequência de batimento das asas de uma abelha). Para fazer funcionar sistemas tão refinados, o grau máximo de tolerância na fabricação é de apenas 76 microns.
Graças a essa evolução tecnológica, hoje alguns carros diesel figuram entre os mais econômicos e menos poluentes. Equipados com a última geração do sistema common rail da Delphi (que este ano completa 12 anos), o Volkswagen Polo BlueMotion com motor três cilindros percorre 100 quilômetros com apenas 3,3 litros de diesel (30,3 km/l) e emite 87 gramas de CO2 por quilômetro – bem abaixo do atual limite europeu de 130 g/km. O Kia Rio EcoDynamics vai ainda mais longe: 3,2l/100 km (31,2 km/l) e 85 g/km de CO2.
SOLUÇÕES ECONÔMICAS
Centro de desenvolvimento de sistemas diesel em Blois, França: foco em soluções econômicas.
Com emissões e consumo descendo e custos tecnológicos subindo, os esforços se voltam para a procura de soluções mais econômicas. No caso da divisão de sistemas diesel da Delphi Europa, o foco está no desenvolvimento de componentes mais compactos e baratos. “Para a nova geração Euro 6, todos os fabricantes querem reduzir o tamanho de seus motores e nós precisamos seguir essa tendência. Outro desafio é o constante aumento da pressão do sistema de injeção”, explica Cousin.
Uma das soluções de baixo custo para sistemas diesel da Delphi é a UPCR, sigla para Unit Pump Commom Rail, uma bomba de alta pressão três vezes mais leve e barata, que pesa apenas 1 quilo (a nova geração deverá ter 900 gramas), contra 3,5 quilos das bombas convencionais. A UPCR foi inicialmente desenvolvida para uma fabricante emergente, a indiana Tata Motors, mas hoje sua adoção já é uma considerada por algumas marcas premium da Europa, por ser uma solução eficiente e barata.
Outro componente em estágio de desenvolvimento na Delphi é um dosador de solução de ureia de alta pressão, para uso em sistemas SCR de redução catalítica de NOx, que poderá equipar alguns carros diesel Euro 6. O corte ainda maior de NOx, previsto na próxima etapa da legislação europeia de emissões, é um dos principais desafios de custo para motores diesel pequenos. Os veículos leves Euro 5 usam o sistema EGR, de recirculação de gases, que dispensa a redução catalítica com injeção de ureia, mas os Euro 6 vão precisar combinar dois sistemas para limitar os poluentes. Cousin diz que alguns fabricantes vão usar o SCR e outros o LNT (sigla de Lean NOx Trap, uma catalisador sem injeção de ureia).
“No fim, com as novas exigências ambientais, a tecnologia dos motores diesel e gasolina estão ficando parecidas”, avalia Cousin, citando que ambos os motores hoje usam soluções similares para redução de peso e consumo, como injeção direta de alta pressão e turboalimentação.
BRASIL
“A eletrônica precipitou esse desenvolvimento e hoje os motores diesel evoluem com grande velocidade”, diz Vicente Pimenta, diretor de relações governamentais da Delphi no Brasil, que também dirigiu a divisão diesel da companhia no País. “Com toda essa evolução e legislação de emissões apertadas é bastante provável que o diesel aumente ainda mais sua penetração na Europa nos próximos 20 anos”, projeta.
Com o uso de diesel proibido para automóveis desde 1976 (época da crise do petróleo), o Brasil perdeu o passo dessa evolução. Desde 2009, tramita no Congresso um Projeto de Lei para liberar a venda de carros diesel no mercado brasileiro, mas o processo parou com as incertezas sobre capacidade de abastecimento e qualidade do combustível. O S50, diesel com baixo teor de enxofre, menos poluente e fundamental para o funcionamento dos motores mais avançados, só começou a ser distribuído em larga escala no País este ano, após ter entrado em vigor a sétima etapa da legislação de emissões para caminhões e ônibus, o Proconve P7, equivalente à norma Euro 5. Com isso, a discussão promete ser retomada e alguns especialistas já apostam na liberação do combustível para veículos pequenos a partir de 2014.
“Eu aposto que sim, a época é muito favorável para isso. Temos petróleo e diesel de qualidade em quantidade suficiente. Acho que não vamos nem devemos perder essa oportunidade”, avalia Pimenta, destacando que o País atualmente não produz etanol suficiente para sua frota e o diesel poderia reduzir emissões, aumentando também o consumo de biodiesel. Para ele, mesmo sendo mais caros, os carros a diesel teriam mercado considerável no Brasil. “Poderia ser algo como 1 milhão de veículos por ano, o que é um volume extraordinário”, diz.
Pimenta avalia que as novas tecnologias desenvolvidas para motores diesel também viriam para o Brasil junto com a liberação do combustível para veículos leves. “Isso, inclusive, abriria a oportunidade para a fabricação local de vários componentes.”